Inovações e desafios da Operação Urbana Água Branca

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Vista aérea de parte da área da Operação Urbana Consorciada Água Branca. Foto: Jonathas Silva

 

Por Paula Santoro*

Criada em 1995 pela Lei n. 11.774, a Operação Urbana Consorciada Água Branca (OUCAB) foi revisada em 2013 (Lei n. 15.893), com projeto urbano que prevê novas intervenções e novos mecanismos de gestão e participação. Essa operação urbana é um pouco diferente das demais, uma vez que propõe intervenções que vão além das obras viárias, historicamente foco da maioria das operações do tipo.

Além disso, a operação abrange uma área que inclui, além de seu perímetro imediato, um perímetro expandido – entre os bairros da Barra Funda e Pompeia, na Zona Oeste de São Paulo. Os recursos arrecadados com a venda de certificados de potencial adicional de construção (Cepacs) no âmbito da operação podem ser utilizados no perímetro imediato sem restrições. Já no perímetro expandido, esses recursos poderão ser investidos apenas em habitação e obras de mobilidade. Essa solução procura dialogar com o fato de que a maioria dos assentamentos precários está fora do perímetro imediato da operação, onde já foram removidos vários de seus moradores, como os da Favela do Sapo e Aldeinha.

Entre as inovações da OUCAB, destacamos a criação do Grupo de Gestão, constituído de forma paritária entre o poder público e a sociedade civil – são 9 membros da prefeitura e 9 membros da sociedade civil, incluindo representantes do mercado imobiliário –, e de caráter deliberativo. Os moradores da área, inclusive, elegeram seus representantes em eleição direta que contou com a participação de 2 mil votantes.

Reunindo-se desde agosto de 2014, o grupo já deliberou sobre as intervenções prioritárias e definiu por onde a operação deverá começar. Além disso, outras importantes decisões tomadas foram a abertura das reuniões a todos os cidadãos, sem necessidade de convite; a inclusão do tema da habitação no perímetro da OUCAB como prioridade; e a redução, em R$ 80 milhões, do volume de recursos destinados à conclusão da construção da Fábrica dos Sonhos – intervenção questionável inserida na operação no momento de sua revisão.

Um primeiro lote de Cepacs foi leiloado em março. De acordo com a Prefeitura, foram negociados 6 mil títulos residenciais, totalizando uma arrecadação de R$ 9,2 milhões, os quais serão investidos na realização de projetos para as intervenções previstas pela Operação, além da reforma emergencial dos conjuntos habitacionais da Comunidade Água Branca.

A transformação pretendida pela OUCAB envolve o adensamento e maior ocupação da região, que possui boa infraestrutura e acessibilidade e apresenta grandes terrenos, ainda com características industriais, que precisam ser parcelados, com abertura de vias e acessos para pedestres.

As intervenções previstas envolvem levantamento do patrimônio histórico e cultural, mobilidade urbana, com ampliação do sistema de transporte coletivo com ênfase em modos não poluentes e corredores de ônibus, equipamentos públicos – como escolas, creches, unidades básicas de saúde –, parques e obras de drenagem.

Em especial, no tema da habitação, são previstos 5 mil atendimentos habitacionais e 22% dos recursos totais da operação serão destinados à produção de habitação de interesse social. Isso não inclui os outros 630 atendimentos habitacionais previstos na lei antiga da Operação (Lei 11.774/95), para os quais até mesmo já existe recurso em caixa.

Na revisão da OUCAB foram incluídas também intervenções previstas no Plano de Metas da Prefeitura, como é o caso da Ponte Raimundo Pereira de Magalhães – a chamada Ponte de Pirituba. A polêmica em torno dessa ponte – que inclui a resistência de moradores da Lapa receosos pelo aumento do fluxo viário que o tráfego pode vir a causar –, dá-se pelo fato de que ela possivelmente será a primeira obra da operação, já que seu projeto está avançado.

Se isso acontecer, a primeira obra seria uma obra viária (como todas as outras operações criticadas por historicamente fazerem apenas obras viárias), que está fora do perímetro imediato da operação, enquanto que a população removida desde 2007 e 2008 aguarda, com aluguel social, as novas habitações, tidas como prioritárias desde 1995, mas que sequer têm projeto.

Se por um lado a revisão da Operação Urbana Consorciada Água Branca trouxe inovações, como as diferentes intervenções já citadas (não apenas viárias), por outro, manteve as mesmas possíveis liberalidades ao mercado das parcerias público-privadas criticadas pela literatura, no âmbito de processos que David Harvey chama de “empresarialismo”, uma alteração do papel do Estado no planejamento e na gestão urbana, substituído pela fórmula das PPPs.

Estamos falando da flexibilização de parâmetros de uso e ocupação do solo, além de outros instrumentos que vão paulatinamente permitindo a transformação da terra em ativos financeiros. A Lei da Operação também prevê a possibilidade de constituir fundos de investimento imobiliários, inclusive com a possibilidade de que estes venham a bancar as desapropriações, desde que solicitadas pela empresa pública.

Assim, antigos desafios permanecem. Além de diferenciar-se das demais operações cuja ênfase se deu sobre a realização de obras viárias, a OUCAB precisa ainda iniciar a reestruturação espacial esperada, em um plano em que haja a renovação de padrões urbanísticos, por meio da oferta de espaços públicos, produção de habitação de interesse social em áreas bem localizadas e melhorias ambientais, em um território com diversidade social.

E um dos maiores desafios será fazer essa reestruturação espacial em um contexto de mercado imobiliário que dá sinais de crise, dificultando a comercialização de Cepacs e, consequentemente, a obtenção de recursos para a transformação esperada.

*Paula Santoro é arquiteta e urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e coordenadora do projeto ao qual o observaSP é vinculado. É também uma das representantes da sociedade civil no Grupo de Gestão da OUCAB.

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